quinta-feira, 21 de junho de 2012

Congresso Americano de Oncologia 2012 ( ASCO) - Melhores trabalhos sobre linfoma

Prezados, O Congresso Americano de Oncologia não é o mais importante da área dos linfomas. Este título fica com o Congresso Americano de Hematologia que ocorre no início de dezembro. No entanto, como ele ocorre aproximadamente seis meses antes, é uma oportunidade de resultados serem apresentados com antecedência. Este ano, tivemos vários trabalhos muito interessantes. Os critérios de seleção foram: relevância, na opinião deste hematologista. Trabalhos envolvendo medicamentos sem perspectiva de aprovação no Brasil como bendamustina, lenalidomida, brentuximabe ou bexaroteno não foram considerados. Vamos a eles: "ABVD (8 cycles) versus BEACOPP (4 escalated cycles => 4 baseline) in stage III-IV high-risk Hodgkin lymphoma (HL): First results of EORTC 20012 Intergroup randomized phase III clinical trial." Este estudo patrocinado pelo grupo europeu (EORTC 20012) terá enorme relevância quando os resultados finais forem conhecidos. Por ora, fiquemos com a análise inicial. O tratamento para linfoma de Hodgkin é selecionado baseado na classificação da doença em um de três tipos, a saber, doença localizada de bom prognóstico, doença localizada de mau prognóstico e doença avançada. Além disto, a doença avançada pode ser classificada em grupos de risco de acordo com a presença de sete fatores. Recentemente, o grupo de tratamento de linfoma mais organizado do mundo, o grupo alemão vêm defendendo ardorosamente a substituição do tratamento clássico com o esquema ABVD por um esquema mais intenso, o BEACOPP escalonado. No estudo em questão, 549 pacientes com linfoma de Hodgkin avançado e pelo menos 3 fatores de risco, foram tratados com ABVD ou com o novo esquema (que foi ligeiramente modificado pela não inclusão de radioterapia). No tempo se seguimento mediano de quase 4 anos, o percentual de pacientes livres de problemas em 4 anos foi de 63,7% vs 69,3% (igual nos 2 grupos). O percentual de pacientes livres de recaída ou de doença resistente foi de 72,8% vs 83,4% (BEACOPP melhor) e o percentual de pacientes vivos foi igual nos dois grupos. Por que o BEACOPP resultou em melhor controle da doença mas não resultou em mais pacientes vivos? Provavelmente, os pacientes que recairam com ABVD foram tratados eficazmente com transplante autólogo de medula. Aqui no Brasil, o ABVD é muito mais fácil de ser feito por ser menos tóxico e por não conter uma medicação oral de difícil obtenção e que está presente no outro tratamento, a procarbazina. "A pooled analysis of 1,144 patients with HIV-associated lymphoma: Assessment of lymphoma-, HIV-, and treatment-specific factors on clinical outcomes." Qualquer estudo com mais de 1000 pacientes impressiona. Pacientes HIV + foram pouco estudados em relação à resposta aos diferentes tratamentos de linfoma. A dose usual de medicação pode ser tóxica para eles e o valor do rituximabe (anticorpo anti-CD20) não parece ser o mesmo que nos pacientes HIV negativos. Neste trabalho os autores analisaram o resultado de 16 trabalhos publicados sobre o tema entre 2000 e 2011. Os dois achados mais importantes, com importância clínica foram: o tratamento com rituximabe é melhor e o esquema EPOCH de quimioterapia é superior ao esquema CHOP. "R-CVP versus R-CHOP versus R-FM as first-line therapy for advanced-stage follicular lymphoma: Final results of FOLL05 trial from the Fondazione Italiana Linfomi (FIL)." Este pode ser o estudo dos meus sonhos. Qual é o melhor tratamento inicial para linfoma folicular? Não há consenso. Alguns dirão R-CHOP porque é o esquema mais intenso e mostrou bons resultados. Outros dirão R-CVP porque é menos tóxico, a medicação adriamicina (o "H" do CHOP) tem toxicidade cardíaca e nunca foi demonstrada superioridade em termos de sobrevida global e o tratamento do linfoma folicular não é um tiro de 100 metros mas uma maratona em que é necessário ter outras armas a mão. Outros usarão a fludarabina que é uma droga muito eficaz em leucemia linfocítica crônica. Outros ainda usarão somente o rituximabe ("R") baseado na busca da menor toxicidade. Neste estudo, três esquemas foram comparados. Infelizmente, não tenho como saber qual a dose de CVP que foi utilizada, já que existem várias possibilidades. Os resultados foram: Pacientes vivos em 3 anos: igual nos 3 grupos. Pacientes sem necessidade de novo tratamento em 3 anos: melhor com R-CHOP (64%) ou R-FM (61%) do que com R-CVP (46%). O esquema R-FM foi muito mais tóxico. Conclusão minha: por enquanto ainda não conseguiram derrubar o esquema R-CVP, o qual prefiro. "R-CHOP14 compared to R-CHOP21 in elderly patients with diffuse large B-cell lymphoma (DLBCL): Final analysis of the LNH03-6B GELA study." Outro estudo fundamental, desta vez em pacientes com linfoma difuso de grandes células B. Os alemãs demonstraram que o esquema CHOP a cada 14 dias era melhor do que o tradicional, feito a cada 21 dias. Os franceses por sua vez, comprovaram que R-CHOP a cada 21 dias é melhor do que CHOP a cada 21 dias. Daí vem a curiosidade: juntando-se os dois achados, será que o R-CHOP a cada 14 dias é melhor do que o R-CHOP a cada 21 dias? 600 pacientes com linfoma difuso de grandes células B e idade entre 60 e 80 anos foram recrutados e tratados com 8 ciclos de R-CHOP a cada 14 dias ou a cada 21 dias. Resultados: a resposta aos dois tipos de tratamento foi idêntica sobre qualquer dos critérios analisados. Acho que por ser menos custoso, o tratamento de escolha continuará o R-CHOP a cada 21 dias. Bem, existiram outros trabalhos mas creio que estes foram os melhores. Aguardemos a liberação de novas drogas para ampliarmos a nossa análise. Um abraço a todos.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

A importância da Bula ( ou o caso do mabthera )

Prezados, Recebi uma mensagem interessante que gostaria de repartir com vocês. Tratava-se de um parente de paciente com linfoma cujo tratamento prescrito incluia a medicação rituximabe (Mabthera). Os responsáveis do plano de saúde recusaram-se a autorizar o uso desta medicação porque a indicação, linfoma de zona marginal, não constava da bula do medicamento. E agora? como sair desta? Primeiramente, é óbvio que a situação ideal seria atualizar anualmente a bula de todos os medicamentos anualmente de forma a incorporar novas indicações. Só que para isto seria necessária a anuência da ANVISA que é quem libera as indicações do medicamento. Assim, forçosamente, a bula de determinados medicamentos fica defasada com o tempo. Especificamente em relação ao rituximabe, visitei o site do fabricante (ROCHE) e as indicações da bula brasileira em relação aos linfomas são: "INFORMAÇÕES TÉCNICAS AOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE 1. INDICAÇÕES MabThera® é indicado ao tratamento de: Linfoma não Hodgkin - pacientes com linfoma não Hodgkin de células B, baixo grau ou folicular, CD20 positivo, recidivado ou resistente à quimioterapia; - pacientes com linfoma não Hodgkin difuso de grandes células B, CD20 positivo, em combinação à quimioterapia CHOP; - pacientes com linfoma não Hodgkin de células B, folicular, CD20 positivo, não tratados previamente, em combinação com quimioterapia. A combinação com a quimioterapia CVP é de indicação exclusiva para linfomas foliculares, exceto os linfomas foliculares do tipo 3 (correspondente ao linfoma folicular de grandes células da Working Formulation); - pacientes com linfoma folicular, como tratamento de manutenção, após resposta à terapia de indução. " Assim, caso o médico queira utilizar o rituximabe no tratamento inicial, a indicação de bula se restringe ao linfoma difuso de grandes células e ao linfoma folicular, ambos em combinação com quimioterapia. Na maioria dos casos, não haverá problema já que este 2 tipos de linfomas perfazem quase 70% dos casos. Mas, quando temos um linfoma da zona marginal, que é um linfoma indolente CD20 positivo, a regra da bula é utilizá-lo apenas como segundo tratamento. Infelizmente, será difícil haver um grande estudo para estes pacientes com linfomas menos comuns, que suporte inquestionavelmente o uso do rituximabe como primeiro tratamento mas, considerando-se que os efeitos colaterais desta droga são menores que os da quimioterapia ou eventualmente de uma retirada do baço, acho que seria cabível que o médico assistente fizesse um relatório justificando a indicação. Pode ser que o seguro saúde mostre alguma sensibilidade e aprove a medicação. Um abraço, Rony