sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Destaques em Linfomas no Congresso Americano de Hematologia

Como os seguidores deste blog sabem, o Congresso Americano de Hematologia, que ocorre no mês de dezembro, é o principal evento do ano na área de linfomas. Este ano, infelizmente, não trago muitas novidades para vocês. Contudo, alguns trabalhos apresentados têm muita relevância. Vamos a eles: 1- Discrimination of an Early Unfavorable Risk Group Has Significant Impact On Treatment Outcome in Early-Stage Hodgkin Lymphoma: An Analysis of International Staging Definitions and Risk Factors O Grupo alemão de estudos em Linfoma de Hodgkin é o mais importante do mundo. Aqui, eles fizeram a análise de 1173 pacientes com Linfoma de Hodgkin limitado a uma área do corpo ,ou mais de uma se estas forem próximas, e demonstraram na prática o que já era pensado na teoria. A presença de fatores de risco bem definidos leva a um pior prognóstico quando tratados de forma igual. 2- Involved Field Radiotherapy Versus No Further Treatment in Patients with Clinical Stages IA and IIA Hodgkin Lymphoma and a ‘Negative’ PET Scan After 3 Cycles ABVD. Results of the UK NCRI RAPID Trial Este estudo é outro que indicou que existem pacientes com Linfoma de Hodgkin que não precisam receber radioterapia após a quimioterapia. Pacientes que fizeram o exame PET após 3 ciclos de ABVD e este se mostrou negativo foram divididos em dois grupos. No primeiro,foi feito a radioterapia e no segundo não foi feito o tratamento. Os resultados dos grupos naõ evidenciaram diferença estatística. Assim, este é mais um trabalho que aponta na direção de que o PET negativo é suficiente para limitar o uso da radioterapia. 3- Rituximab Dose-Dense Chemotherapy Followed by Intensified High-Dose Chemotherapy and Autologous Stem Cell Transplantation (HDC+ASCT) Significantly Reduces the Risk of Progression Compared to Standard Rituximab Dose-Dense Chemotherapy As First Line Treatment in Young Patients with High-Risk (aa-IPI 2–3) Diffuse Large B-Cell Lymphoma (DLBCL): Final Results of Phase III Randomized Trial DLCL04 of the Fondazione Italiana Linfomi (FIL) Este talvez tenha sido o melhor artigo do congresso na área de linfomas, do ponto de vista clínico. Não sabemos conn certeza qual é o melhor tratamento para pacientes com Linfoma Difuso de Grandes Células B que apresentam fatores de risco tais como doença disseminada e aumento dos níveis de desidrogenase lática no sangue. Pelo menos dois trabalhos anteriores, sugeriam que a realização de um transplante autólogo de medula óssea poderia melhorar o prognóstico destes pacientes. Este foi o primeiro trabalho que comparou o tratamento atual com o tratamento com o transplante de forma direta. A diferença na taxa de recaída em 3 anos favoreceu os pacientes submetidos ao autotransplante (30% vs 41%). Enquanto não tivermos como identificar a priori quem são os pacientes que vão se beneficiar do autotransplante - já que a diferença entre os tratamentos foi de apenas 11% - talvez seja interessante a discussão desta possibilidade de tratamento com todos os pacientes jovens que apresentem Linfoma Difuso de Grandes Células de Alto Risco. Fico por aqui. Até a próxima.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Linfoma angioimunoblástico - revisão (atualização)

Em todos estes anos escrevendo este blog, o tópico que mais gerou visualizações foi o de linfoma angioimunoblástico. Obviamente isto se deveu ao fato de uma personalidade pública ter sido acometida deste linfoma. De qualquer modo, como dei uma palestra sobre este tipo de linfoma no último Congresso Brasileiro de Hematologia (nov/2012), aproveito para dividir com vcs esta apresentação. Um abraço.

Linfoma Folicular - questões práticas e de tratamento

Dia destes, fui fazer uma palestra sobre o papel da manutenção no tratamento do linfoma folicular (LF). Primeiro, comecemos do início. O LF é o segundo tipo mais comum de linfoma. Quando os linfoma são subdivididos em linfomas agressivos e indolentes, o LF é o subtipo mais comum de linfoma indolente. Os linfomas indolentes têm como características comuns, um longo tempo de desenvolvimento e progressão e uma probabilidade maior de ter doença em vários locais do corpo, o que definitivamente não tem implicação prognóstica. Quais os fatores que têm implicação prognóstica? O primeiro é o grau do LF. Os LF graus I e II são doenças mais indolentes. Já nos LF grau III, devemos fazer a distinção entre IIIa e IIIB – não se preocupem pois não vou detalhar estes gras pois é coisa para patologista determinar- porque o LF grau IIIB é bem mais agressivo. O segundo fator é o FLIPI que é um índice formado por fatores de risco, tais como: anemia, desidrogenase lática, estádio da doença, performance status e idade. Quanto maior o FLIPI, mais possibilidades de problema. Mas, como o tratamento tem a ver com isto? Bem, isto vai depender do médico responsável pelo tratamento. Uma linha de médicos faz o mesmo tratamento para qualquer situação (R-CHOP, na maioria das vezes). Uma segunda linha de médicos, que acredito ser minoritária, procura adaptar o tratamento ao tipo de paciente. Eu estou incluído nesta última. Apesar disto, existe unanimidade em vários pontos: 1-O tratamento só deve ser iniciado nos pacientes sintomáticos ou que tenham gânglios de tamanho muito aumentado. Eu sigo os critérios do grupo francês (GELF) que consideram um gânglio maior do que 7 cm ou mais de três gânglios com mais de 3 cm. 2-O tratamento inicial deve incluir rituximabe. Existe a opção de rituximabe isolado em situações muito especiais ou rituximabe com quimioterapia para a maioria doa casos. Os esquemas de quimioterapia mais comuns são: R-CHOP (mais eficaz porém mais tóxico), R-CVP (menos eficaz porém menos tóxico), R-bendamustina (a bendamustina deve estar disponível em nosso meio em meados de 2013) e R-fludarabina. 3-O uso de manutenção com doses extras de rituximabe a cada 2 ou 3 meses por um período de dois anos está formalmente indicado para os pacientes que estão em tratamento por uma segunda vez. Dois grandes estudos com estes pacientes mostraram vantagem de sobrevida. 4-No caso do tratamento inicial, a manutenção foi testada no estudo PRIMA. Após tratamento com R-CHOP, R-CVP ou R-FCM, os pacientes que tinham boa resposta foram divididos em dois grupos. Um dos grupos não fez tratamento adicional e no outro foi feita manutenção por 2 anos com rituximabe a cada 2 meses. Os resultados indicam uma melhor resposta para os pacientes que fizeram a manutenção porém não houve diferença na sobrevida. Portanto, estes resultados dão margem ao médico escolher uma das estratégias a seu critério. 5-No caso do paciente que tem uma resposta inadequada à quimioterapia ou recaída muito precoce (nos primeiros 2 anos), o melhor tratamento é o transplante autólogo de medula óssea. 6-No paciente com LF grau IIIB ou no paciente que tem um aparecimento de linfoma agressivo no curso clínico do LF, o tratamento é R-CHOP. É por isto que eu sou um tanto crítico no uso indiscriminado do R-CHOP. Se no futuro ele for necessário, não poderá ser repetido. Um abraço. Aguardo os comentários...

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Linfoma da Célula do Manto _ mudança no tratamento

Não é todo dia que aparece um trabalho com grande potencial de alterar a forma de tratamento de um linfoma. Há uma semana, isto aconteceu. Na edição de 09 de agosto de 2012 do "New England Journal of Medicine", a revista médica mais importante do mundo, pesquisadores alemãs publicaram os resultados do estudo comparativo de tratamentos para pacientes portadores de linfoma da célula do manto com mais de 60 anos de idade e, portanto, não candidatos ao transplante autólogo de medula óssea. O estudo consistiu de duas partes: Parte 1 - 485 pacientes foram divididos em dois grupos e receberam dois tipos de tratamento inicial: 8 ciclos de R-CHOP ou 6 ciclos de R-FC Parte 2 - 316 pacientes que tiveram algum tipo de regressão de doença com o tratamento da parte 1 foram divididos em dois grupos: apenas observação ou manutenção com rituximabe (Mabthera) mais ou menos como é prescrito atualmente para pacientes com linfoma folicular. Bem, em relação à parte 1, os resultados não são tão interessantes porque o esquema R-FC (rituximabe, fludarabina e ciclofosfamida) não é tão utilizado no Brasil. De qualquer forma, a resposta ao esquema R-CHOP (rituximabe, ciclofosfamida, adriamicina, vincristina e prednisona) foi melhor. A percentagem de pacientes vivos em 4 anos com R-CHOP foi de 62% x 47% com o esquema R-FC. O que acredito ser muito importante é que o uso de rituximabe na manutenção foi associado a um melhor prognóstico. Como exemplo, no grupo tratado com R-CHOP a manutenção prolongou o número de sobreviventes em 4 anos de 63% para 87%. Este número é muito elevado considerando-se a idade média dos pacientes que foi de 70 anos. De agora em diante, pacientes que não podem ser submetidos ao transplante autólogo de medula, provavelmente deverão receber esta combinação de R-CHOP 8 ciclos e manutenção com rituximabe. Abraço a todos.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Congresso Americano de Oncologia 2012 ( ASCO) - Melhores trabalhos sobre linfoma

Prezados, O Congresso Americano de Oncologia não é o mais importante da área dos linfomas. Este título fica com o Congresso Americano de Hematologia que ocorre no início de dezembro. No entanto, como ele ocorre aproximadamente seis meses antes, é uma oportunidade de resultados serem apresentados com antecedência. Este ano, tivemos vários trabalhos muito interessantes. Os critérios de seleção foram: relevância, na opinião deste hematologista. Trabalhos envolvendo medicamentos sem perspectiva de aprovação no Brasil como bendamustina, lenalidomida, brentuximabe ou bexaroteno não foram considerados. Vamos a eles: "ABVD (8 cycles) versus BEACOPP (4 escalated cycles => 4 baseline) in stage III-IV high-risk Hodgkin lymphoma (HL): First results of EORTC 20012 Intergroup randomized phase III clinical trial." Este estudo patrocinado pelo grupo europeu (EORTC 20012) terá enorme relevância quando os resultados finais forem conhecidos. Por ora, fiquemos com a análise inicial. O tratamento para linfoma de Hodgkin é selecionado baseado na classificação da doença em um de três tipos, a saber, doença localizada de bom prognóstico, doença localizada de mau prognóstico e doença avançada. Além disto, a doença avançada pode ser classificada em grupos de risco de acordo com a presença de sete fatores. Recentemente, o grupo de tratamento de linfoma mais organizado do mundo, o grupo alemão vêm defendendo ardorosamente a substituição do tratamento clássico com o esquema ABVD por um esquema mais intenso, o BEACOPP escalonado. No estudo em questão, 549 pacientes com linfoma de Hodgkin avançado e pelo menos 3 fatores de risco, foram tratados com ABVD ou com o novo esquema (que foi ligeiramente modificado pela não inclusão de radioterapia). No tempo se seguimento mediano de quase 4 anos, o percentual de pacientes livres de problemas em 4 anos foi de 63,7% vs 69,3% (igual nos 2 grupos). O percentual de pacientes livres de recaída ou de doença resistente foi de 72,8% vs 83,4% (BEACOPP melhor) e o percentual de pacientes vivos foi igual nos dois grupos. Por que o BEACOPP resultou em melhor controle da doença mas não resultou em mais pacientes vivos? Provavelmente, os pacientes que recairam com ABVD foram tratados eficazmente com transplante autólogo de medula. Aqui no Brasil, o ABVD é muito mais fácil de ser feito por ser menos tóxico e por não conter uma medicação oral de difícil obtenção e que está presente no outro tratamento, a procarbazina. "A pooled analysis of 1,144 patients with HIV-associated lymphoma: Assessment of lymphoma-, HIV-, and treatment-specific factors on clinical outcomes." Qualquer estudo com mais de 1000 pacientes impressiona. Pacientes HIV + foram pouco estudados em relação à resposta aos diferentes tratamentos de linfoma. A dose usual de medicação pode ser tóxica para eles e o valor do rituximabe (anticorpo anti-CD20) não parece ser o mesmo que nos pacientes HIV negativos. Neste trabalho os autores analisaram o resultado de 16 trabalhos publicados sobre o tema entre 2000 e 2011. Os dois achados mais importantes, com importância clínica foram: o tratamento com rituximabe é melhor e o esquema EPOCH de quimioterapia é superior ao esquema CHOP. "R-CVP versus R-CHOP versus R-FM as first-line therapy for advanced-stage follicular lymphoma: Final results of FOLL05 trial from the Fondazione Italiana Linfomi (FIL)." Este pode ser o estudo dos meus sonhos. Qual é o melhor tratamento inicial para linfoma folicular? Não há consenso. Alguns dirão R-CHOP porque é o esquema mais intenso e mostrou bons resultados. Outros dirão R-CVP porque é menos tóxico, a medicação adriamicina (o "H" do CHOP) tem toxicidade cardíaca e nunca foi demonstrada superioridade em termos de sobrevida global e o tratamento do linfoma folicular não é um tiro de 100 metros mas uma maratona em que é necessário ter outras armas a mão. Outros usarão a fludarabina que é uma droga muito eficaz em leucemia linfocítica crônica. Outros ainda usarão somente o rituximabe ("R") baseado na busca da menor toxicidade. Neste estudo, três esquemas foram comparados. Infelizmente, não tenho como saber qual a dose de CVP que foi utilizada, já que existem várias possibilidades. Os resultados foram: Pacientes vivos em 3 anos: igual nos 3 grupos. Pacientes sem necessidade de novo tratamento em 3 anos: melhor com R-CHOP (64%) ou R-FM (61%) do que com R-CVP (46%). O esquema R-FM foi muito mais tóxico. Conclusão minha: por enquanto ainda não conseguiram derrubar o esquema R-CVP, o qual prefiro. "R-CHOP14 compared to R-CHOP21 in elderly patients with diffuse large B-cell lymphoma (DLBCL): Final analysis of the LNH03-6B GELA study." Outro estudo fundamental, desta vez em pacientes com linfoma difuso de grandes células B. Os alemãs demonstraram que o esquema CHOP a cada 14 dias era melhor do que o tradicional, feito a cada 21 dias. Os franceses por sua vez, comprovaram que R-CHOP a cada 21 dias é melhor do que CHOP a cada 21 dias. Daí vem a curiosidade: juntando-se os dois achados, será que o R-CHOP a cada 14 dias é melhor do que o R-CHOP a cada 21 dias? 600 pacientes com linfoma difuso de grandes células B e idade entre 60 e 80 anos foram recrutados e tratados com 8 ciclos de R-CHOP a cada 14 dias ou a cada 21 dias. Resultados: a resposta aos dois tipos de tratamento foi idêntica sobre qualquer dos critérios analisados. Acho que por ser menos custoso, o tratamento de escolha continuará o R-CHOP a cada 21 dias. Bem, existiram outros trabalhos mas creio que estes foram os melhores. Aguardemos a liberação de novas drogas para ampliarmos a nossa análise. Um abraço a todos.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

A importância da Bula ( ou o caso do mabthera )

Prezados, Recebi uma mensagem interessante que gostaria de repartir com vocês. Tratava-se de um parente de paciente com linfoma cujo tratamento prescrito incluia a medicação rituximabe (Mabthera). Os responsáveis do plano de saúde recusaram-se a autorizar o uso desta medicação porque a indicação, linfoma de zona marginal, não constava da bula do medicamento. E agora? como sair desta? Primeiramente, é óbvio que a situação ideal seria atualizar anualmente a bula de todos os medicamentos anualmente de forma a incorporar novas indicações. Só que para isto seria necessária a anuência da ANVISA que é quem libera as indicações do medicamento. Assim, forçosamente, a bula de determinados medicamentos fica defasada com o tempo. Especificamente em relação ao rituximabe, visitei o site do fabricante (ROCHE) e as indicações da bula brasileira em relação aos linfomas são: "INFORMAÇÕES TÉCNICAS AOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE 1. INDICAÇÕES MabThera® é indicado ao tratamento de: Linfoma não Hodgkin - pacientes com linfoma não Hodgkin de células B, baixo grau ou folicular, CD20 positivo, recidivado ou resistente à quimioterapia; - pacientes com linfoma não Hodgkin difuso de grandes células B, CD20 positivo, em combinação à quimioterapia CHOP; - pacientes com linfoma não Hodgkin de células B, folicular, CD20 positivo, não tratados previamente, em combinação com quimioterapia. A combinação com a quimioterapia CVP é de indicação exclusiva para linfomas foliculares, exceto os linfomas foliculares do tipo 3 (correspondente ao linfoma folicular de grandes células da Working Formulation); - pacientes com linfoma folicular, como tratamento de manutenção, após resposta à terapia de indução. " Assim, caso o médico queira utilizar o rituximabe no tratamento inicial, a indicação de bula se restringe ao linfoma difuso de grandes células e ao linfoma folicular, ambos em combinação com quimioterapia. Na maioria dos casos, não haverá problema já que este 2 tipos de linfomas perfazem quase 70% dos casos. Mas, quando temos um linfoma da zona marginal, que é um linfoma indolente CD20 positivo, a regra da bula é utilizá-lo apenas como segundo tratamento. Infelizmente, será difícil haver um grande estudo para estes pacientes com linfomas menos comuns, que suporte inquestionavelmente o uso do rituximabe como primeiro tratamento mas, considerando-se que os efeitos colaterais desta droga são menores que os da quimioterapia ou eventualmente de uma retirada do baço, acho que seria cabível que o médico assistente fizesse um relatório justificando a indicação. Pode ser que o seguro saúde mostre alguma sensibilidade e aprove a medicação. Um abraço, Rony

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Novo tratamento para pacientes idosos com linfoma difuso de grandes células B

Prezados, Sem dúvida, o prognóstico dos pacientes com o subtipo mais comum de linfoma, o linfoma difuso de grandes células B (LDGCB) melhorou consideravelmente com o tratamento atual, uma combinação de quimioterapia (conhecida pela carnavalesca sigla de CHOP) com um anticorpo anti-CD20, conhecido como rituximab (nome comercial de Mabthera). O problema é que em nenhum dos estudos consagrados, que se utilizaram deste esquema de tratamento, pacientes com idade superior a 80 anos foram incluídos. Pode parecer um exagero mas, pelo menos nos Estados Unidos, 40% dos casos de LDGCB ocorrem em pessoas com mais de 70 anos. Estudos pequenos em pacientes idosos sugeriram que os resultados são inferiores à metade daqueles obtidos em pacientes de menos de 80 anos. A maior parte dos problemas nesta faixa etária não é decorrente da resistência do linfoma ao tratamento, mas sim da baixa resistência do paciente que acaba padecendo de efeitos tóxicos do tratamento. É por isto, que recebi com grande alegria o resultado do tratamento do considerável número de 150 pacientes com LDGCB e mais de 80 anos, com um esquema de dose reduzida do R-CHOP, denominado R-miniCHOP. Trata-se de um importante estudo por diversos fatores: foi produzido pelo mais ativo grupo de estudos do LDGCB no mundo, conhecido como GELA, que reune Centros da França e Bélgica; e foi publicado pela conceituada revista Lancet Oncology no número de maio de 2011; e, finalmente, pelo número de pacientes tratados. Em resumo, o esquema R-miniCHOP é igual ao CHOP só que com metade da dose de adriblastina (a letra H do nome), cerca de 60% da dose de ciclofosfamida (a letra C), cerca de metade da dose de vincristina (a letra O) e cerca de 60% da dose de prednisona (a letra P). O desenho do estudo previa um aumento de 15% na porcentagem de pacientes vivos ao final de dois anos. Pois bem, o resultado foi tão bom que, ao final de dois anos, o número alcançado foi 35% maior do que o esperado com esquemas mais fortes de tratamento. O resultado foi tão bom que os pesquisadores arriscaram-se a colocar como conclusão do artigo que este seria o novo padrão de tratamento para pacientes com mais de 80 anos e com LDGCB. Eu tendo a concordar mas ressalvo que pacientes com boa condição de saúde física poderão ser tratados com esquemas para pacientes mais jovens porque, apesar da melhora no prognóstico com o R-miniCHOP, os resultados ainda foram aquém daqueles obtidos com o esquema R-CHOP em pacientes de 60 a 80 anos. O ideal seria comparar estes dois tratamentos, mas levaria muito mais tempo. Um abraço, até a próxima.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Melhores Trabalhos do Congresso Americano de Hematologia 2011 parte 1 (transplante, plaquetas, linfoma ocular, linfoma T periférico, esclerose múltipla, Linfoma de Hodgkin, radioterapia e PET )

Prezados, O Congresso Americano de Hematologia acontece anualmente em dezembro. É o maior evento mundial na área de hematologia e é nele que tomamos ciência dos avanços que emergirão no futuro próximo em nossa área. Dei uma conferida nos trabalhos da área de linfoma e da área de transplante e, modestamente, escolhi os melhores. Como bônus, comento dois trabalhos reservados para a sessão plenária. Os resumos podem ser conferidos na internet gratuitamente em www.hematology.org . Vamos a relação seguida de comentários meus: 1 Increased Incidence of Chronic Graft-Versus-Host Disease (GVHD) and No Survival Advantage with Filgrastim-Mobilized Peripheral Blood Stem Cells (PBSC) Compared to Bone Marrow (BM) Transplants From Unrelated Donors: Results of Blood and Marrow Transplant Clinical Trials Network (BMT CTN) Protocol 0201, a Phase III, Prospective, Randomized Trial Este foi o trabalho número 1 e não foi a toa. Existem duas fontes de célula-tronco para o transplante alogênico, isto é, quando o doador e o receptor não são a mesma pessoa: a medula óssea que exige, para ser coletada, de anestesia geral do doador e que é um transplante mais demorado para o receptor e o sangue periférico. Este último ganhou terreno em detrimento do anterior porque é tecnicamente mais fácil de ser coletado já que não é necessário centro cirúrgico, anestesia geral e uma equipe de quatro hematologistas para a coleta, apresenta uma maior quantidade de células progenitoras e por isto o tempo de internação do paciente é mais curto e, finalmente, é mais rico em linfócitos T do que a medula e estudos em animais mostraram que as células T são importantes no processo de cura do linfoma ou da leucemia. Neste estudo, os pacientes foram divididos em um grupo que recebeu células-tronco da medula óssea e outro que recebeu-as do sangue periférico. O resultado foi surpeendente porque não houve diferença no resultado dos dois tipos de células-tronco e houve maiores efeitos colaterais e longo prazo no grupo de pacientes que recebeu as células-tronco obtidas do sangue periférico. Assim, os Centros de Transplante voltarão ao passado e aos centros cirúrgicos...para obter células-tronco para transplante. 2 Platelet Production System Using An Immortalized Megakaryocyte Cell Line Derived From Human Pluripotent Stem Cells Seria um sonho a possibilidade de obter plaquetas em laboratório. Atualmente, as plaquetas são obtidas por doação de sangue e, muitas vezes, um paciente pode precisar de plaquetas obtidas de oito ou mais doadores. Neste estudo inicial, os pesquisadores conseguiram estabelecer uma cultura de células produtoras de plaquetas que foram imortalizadas. É uma esperança para os pacientes que necessitam destas transfusões. 267 Final Results of a Multicenter Phase II Trial with Translational Elements to Investigate the Possible Infective Causes of Ocular Adnexal Marginal Zone B-Cell Lymphoma (OAMZL) with Particular Reference to Chlamydia Species and the Efficacy of Doxycycline As First-Line Lymphoma Treatment Os linfomas de zona marginal têm estreita relação com agentes infecciosos. O maior exemplo é o linfoma do estômago associado à bactéria Helicobacter pilory. No caso dos linfomas de zona marginal oculares, encontrou-se associação com outro tipo de bactéria, as Chlamydias. Neste estudo, foram apresenatdos os resultados do impacto do tratamento desta bactéria na evolução do linfoma. Para isto, usou-se um antibiótico, a doxiciclina. Os resultados foram muito bons: a Chlamydophila psittaci foi encontrada em 86% dos pacientes com linfoma de zona marginal e ataxa de erradicação desta bactéria com o uso do antibiótico foi de 50% em um ano. O tratamento antibiótico gerou a regressão completa do linfoma ocular wem 18% dos pacientes, regressão de mais de 50% do linfoma em 47% dos casos. A taxa de progressão do linfoma em 2 anos foi de 45% apenas. A conclusão é que o tratamento antibiótico foi eficaz em mais da metade dos casos, o que gera uma nova forma de tratamento do linfoma de zona margunal ocular. 331 High-Dose Chemotherapy and Autologuos Stem Cell Transplantation in Previously Untreated Peripheral T-Cell Lymphoma - Final Analysis of a Large Prospective Multicenter Study (NLG-T-01) Os linfomas T periféricos são difíceis de tratar. A quimioterapia de altas doses e o transplante autólogo de medula podem oferecer melhor prognóstico. Infelizmente, dada a sua raridade, estudos comparando tratamentos com e sem o transplante ainda não foram feitos. Apesar disto, no estudo acima reportou-se a maior série de pacientes com linfoma T periférico tratados com transplante autólogo até o momento, 166 pacientes. Cerca de 70% dos pacientes responderam ao tratamento quimioterápico inicial e foram submetidos ao transplante e 51% dos pacientes estavam vivos em 5 anos e 44% não apresentavam doença e portanto poderiam estar curados. A impressão geral é de um tratamento bastante eficaz, dada a gravidade desta doença porém os estudos ideais devem comparar os tratamentos para tirar-se uma melhor conclusão. 334 Autologous Hematopotoietic Stem Cell Transplantation in Multiple Sclerosis with An Intermediate Intensity Conditioning Regimen: The Italian Multi-Centre Experience Os pesquisadores estudaram 74 pacientes com esclerose múltipla resistentes aos tratamentos habituais que foram submetidos a um tratamento de alta intensidade, o transplante autólogo de medula óssea. Já comentei neste Blog que acho este um dos caminhos mais promissores para o tratamento desta doença. O acompanhamento médio foi de 4 anos. Todos os pacientes haviam apresentado piora da esclerose múltipla no ano anterior ao transplante. Dois pacientes faleceram no transplante. Em cinco anos, 66% dos pacientes ficaram estáveis ou melhoraram. Nos 18 pacientes com acompanhamento de mais de 7 anos, 44% ainda se mantinham estáveis ou melhores. Acho que é necessário sensibilizar os neurologistas para pelo menos tomarem ciência que existe esta alternativa de tratamento que resulta em resposta duradoura em quase metade dos pacientes. 335 Positron Emission Tomography Status and Tandem High-Dose Therapy Favorably Influence Outcome of Patients with Relapsed and/or Refractory Hodgkin Lymphoma PET (tomografia por emissão de pósitrons) já é um exame essencial em muitos casos de linfoma. Uma das melhores indicações deste exame é na avaliação de pacientes com linfoma de Hodgkin que serão submetidos a um transplante autólogo de medula. Uma vez detectada a falha do tratamento inicial, o paciente é submetido a um segundo tipo de quimioterapia e, caso tenha boa resposta, consolida o tratamento com o transplante. A definição de "boa resposta" é vaga. Trabalhos recentes demonstraram que uma normalização do PET significa uma "boa resposta". A questão é o que fazer com os pacientes que mantém-se PET positivos nesta avaliação. Neste estudo, os autores dividiram os pacientes em dois grupos de acordo com o PET pré-transplante. Quem ficou negativo fez o transplante habitual. Quem mantinha positividade era submetido a dois transplantes autólogos Apesar do resultado indicar que pacientes PET negativo têm um melhor prognóstico, a análise do subgrupo de pacientes PET positivo indicou que o duplo transplante resultou em quase 50% de pacientes vivos e sem doença em 5 anos, um valor muito maior do que o obtido com um único transplante. Mais estudos são necessários porém esta parece ser uma boa estratégia, ou seja, utilizar o duplo-transplante em pacientes que persistam PET positivos imediatamente antes do auto-transplante. 589 Reduced Intensity of Chemotherapy and PET-Guided Radiotherapy in Patients with Advanced Stage Hodgkin Lymphoma: The GHSG HD15 Final Este é um dos estudos mais esperados pelos médicos de linfoma. A pergunta era: será que o aperfeiçoamento do tratamento com quimioterapia nos pacientes com linfoma de Hodgkin e com o desenvolvimento da re-avaliação de doença após o tratamento por PET (vide resumo anterior), os pacientes poderiam ser poupados de radioterapia? Apesar de altamente eficaz como consolidação do tratamento com quimioterapia, a radioterapia está associada a mais efeitos colaterais tardios, os quais envolvem até cânceres. 2126 pacientes com linfoma de Hodgkin muito avançado foram tratados com quimioterapia e submetidos a um PET ao final do tratamento se houvesse alguma lesão residual maior do que 2,5 cm. Aqueles que eram PET negativos não recebiam radioterapia ao contrário dos pacientes PET positivos. Esta estratégia possibilitou a redução do uso da radioterapia de 71% dos pacientes para 11% sem nenhum comprometimento da resposta, que foi excelente (ausência de linfoma após 4 anos de tratamento em 92,1% dos pacientes). Esta é mais uma pá de cal no uso de radioterapia para linfoma de Hodgkin. Cabe fazer a ressalva que os pacientes deste estudo foram tratados com um esquema muito intenso e pouco utilizado no Brasil (BEACCOP escalonado), o que dificulta a adoção desta estratégia por aqui. 590 Final Analysis of a Randomized Comparison of ABVD Chemotherapy with a Strategy That Includes Radiation Therapy (RT) in Patients with Limited-Stage Hodgkin Lymphoma (HL): NCIC CTG/ECOG HD.6 Este estudo já foi até publicado em sua forma completa. Trata-se de um estudo diferenciado porque o acompanhamento dos pacientes foi por gigantes 12 anos. Ao contrário do estudo anterior, pacientes com linfoma de Hodgkin limitado foram tratados com radioterapia associada a dois ciclos de quimioterapia (ABVD, a mais utilizada em nosso meio) ou apenas com quimioterapia, quatro ciclos de ABVD. No caso de pacientes que não apresentavam sinais de doença alguma após dois ciclos de ABVD, a retirada da radioterapia não causou nenhum mal. Pelo contrário, no longo prazo, pacientes submetidos a radioterapia tiveram mais efeitos colaterais. Cabe ressaltar que o estudo é antigo e a técnica de radioterapia atual é bem menos tóxica. Mas assim é a pesquisa em medicina. Quando respondemos uma pergunta, muitas vezes a pergunta já é outra.